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Pedra do Ingá (PB) |
Seguindo o roteiro do texto
anterior, onde exploramos os Geoparques localizados no interior dos estados do
RN, CE e PB, aqui seguimos o caminho, continuando a "volta pelo
Sertão", percorrendo o extremo oeste do estado de Pernambuco, voltando ao
Sertão Paraibano e ao seu litoral.
As surpresas que encontramos
quando se percorre o interior dos estados nordestinos são grandes, a começar
pelo clima: dependendo de onde se está, à noite é frio e o edredon é bem-vindo!
DEIXANDO O CEARÁ E A PARAÍBA PARA TRÁS POR
UM MOMENTO
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Estradinha "boa" em direção à Pernambuco |
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Quase chegando na "plantação de pau"! |
Quando deixamos Santana do Cariri
para trás, atravessamos a Chapada do Araripe - esta chapada está presente nos
estados do Ceará, Pernambuco e Piauí - por estrada estreita, de chão e muita pedra
(aqui conhecida por “piçarra”), com subida forte em reduzida!!
Ao chegarmos ao alto do platô,
numa bifurcação, paramos pra perguntar a um senhor matuto a direção para Exu,
ao que ele respondeu: “Lá na frentão, bem lá na frentão, tem uma plantação
de pau... lá você pega à direita, pois à esquerda volta pra Crato.” Dito e
feito. Lá na frentão havia uma plantação de pau (eucalipto) e uma placa meio
apagada indicava à esquerda Crato (CE) e à direita, Exu (PE).
Agora em asfalto, meio ruim,
descemos a serra em direção à Exu. A paisagem é linda, uma zona de transição
entre o cerrado e mata atlântica (interessante que aqui, na Chapada, não está
presente a caatinga!).
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Já em Pernambuco, descendo a serra em direção à Exu |
UM POUCO DE HISTÓRIA
Exu, situada na Serra do Araripe, na divisa dos estados de Pernambuco e Ceará, foi fundada em 1734 e emancipada em 1907. A denominação “Exu” possui duas versões. Uma é a corruptela do nome do povo “Açu” da nação Cariri e outra é o nome indígena de uma abelha de ferrão, “Inxu”, que ao ferroar causa muita dor. Por ser uma região rica em água e terra com boa qualidade para plantio e criação animal, foi invadida pelos primeiros colonizadores que expulsaram os indígenas cariri na região – estamos falando da época em que aqui pertencia a Capitania da Baía de Todos os Santos. Posteriormente vieram os jesuítas e estabeleceram a primeira capela.
Nossa surpresa foi descobrir que Exu
é a terra natal do Gonzagão! É, ele mesmo, o Rei do Baião! Aproveitamos para
tirar foto com a estátua do cidadão ilustre numa praça da cidade e seguimos até
o Museu Aza Branca (com “Z” mesmo), casa onde Luiz Gonzaga viveu e onde está
seu mausoléu.
Além de Luiz Gonzaga, a cidade
também é o berço de Chiquinha Gonzaga, nascida Francisca Januária dos Santos,
cantora, safoneira (sanfona de 8 baixos) e compositora brasileira (1927 – 2011).
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Com Poeta Falcão (e seus cordeis) e Jober, viajante de bike |
Já na entrada do Museu conhecemos
o Jober, viajante de bike, que saiu de João Pessoa há um mês e está viajando
com/em seu companheiro, Tubarão Negro. Logo encontramos o Poeta Falcão, que
abrilhantou nossa visita com cordéis e poesias, além de nos acompanhar e
explicar tudo na Casa de Januário (pai de Luiz Gonzaga, que era luthier e com
quem Gonzagão aprendeu a tocar o baixo).
Fomos ao mausoléu, onde está
também a esposa de Luiz, e ao Museu que relata toda a trajetória de vida do
artista, seus prêmios, maçonaria, etc e tal. Interessante é que aqui é proibido
tirar fotos (sabe-se lá porquê!).
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Esta foto não existe, tá? |
Por fim, visitamos a casa onde
ele e sua esposa viveram os últimos anos de vida, muito simples e aconchegante!
Despedimo-nos de Falcão e de
Jober e seguimos em busca de um local para pernoite, já em Serrita.
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Despedindo-nos do Jober e seu Tubarão Negro |
No dia seguinte, parada para foto
em Serra Talhada e início da subida para Triunfo, localizada a 1050 msnm!!!
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Descendo em direção à Serra Talhada (ao fundo) pra depois subir pra Triunfo |
Triunfo está localizada na
Serra da Baixa Verde (planalto da Borborema) e o ponto mais alto de Pernambuco
é no Pico do Papagaio (1200 msnm), um dos pontos turísticos da cidade. Fundada
em 1884, Triunfo é conhecida por ser como “Oásis do Sertão” pelo seu clima
ameno e chuvoso, diferente das outras cidadezinhas da circunvizinhança, cujo
clima é semiárido.
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"Subidinha" pra Triunfo |
UM POUCO DE HISTÓRIA
O nome da cidade, Triunfo, é uma
homenagem ao local onde Baixa Verde (nome anterior) e seus habitantes estavam se desenvolvendo,
o que desagradava o município vizinho de Flores, cujos habitantes muitas vezes
atacaram a feira local na tentativa de acabá-la, interferindo no comércio e seu
sustento. Nestes ataques muita gente acabou morrendo, mas o povo de Baixa Verde
resistiu e progrediu, mudando o nome da cidade para Triunfo em função disto.
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Casario preservado e bonito da cidade |
Inicialmente a região era ocupada
pelos indígenas Cariri da nação Tapuia, mas no início do séc. XIX chegou ao
local o frei capuchinho Vital de Frascarolo, trazendo algumas imagens, dentre
elas a de Nossa Senhora das Dores, que acabou com Padroeira do local.
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Theatro Cinema Guarany (1922) |
Nossa primeira parada na cidade
foi no Theatro Cinema Guarany, de estilo eclético e que foi inaugurado em 1922,
cuja visitação é gratuita. Dali, sempre a pé, fomos ao centro de informação ao
turista, anexo ao Museu da cidade, onde adquirimos o ingresso para todos os
museus da cidade (são 4 no total).
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Interior do Theatro |
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Museu da cidade e centro de informação ao turista |
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Ingressos para os Museus da cidade |
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Visitando o Museu Histórico da cidade de Triunfo |
No Museu Casa do Careta a Jane
nos explicou a origem e simbologia deste personagem, surgido em 1917, e seu
treco. Inicialmente composto por quilombolas e indígenas, era um “bloco” que saía
durante os festejos do reisado, festa popular que simboliza o nascimento de
Jesus. Os brincantes saem “em trecas”, trajando roupas espalhafatosas,
chocalhos e um relho – espécie de chicote que emite um som parecido com um tiro
quando desferido nas pedras do calçamento ou no ar. As máscaras de origem
indígena Tapuia, ainda são usadas para “esconder” os brincantes.
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Museu Casa do Careta |
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Ouvindo as explicações da Jane |
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Lindos painéis nas ladeiras sem fim da cidade |
Curiosidade: o frei Vidal de Frescolero, conhecido por frei Vidal da Penha, fixou residência num sítio na localidade de Baixa Verde (hoje Triunfo), depois mudando-se para Cabrobó. Em seu luga veio, o missionário frei Ângelo Maurício Niza que mandou construir uma capelinha, sob invocação de Nossa Senhora das Dores, que acabou virando a Padroeira da cidade.
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Matriz N. Sra. das Dores (1803) |
Por ficar no alto de um morro,
achar local plano para acampar aqui na cidade deu um pouco de trabalho. Alguns
viajantes ficam na área do lago, mas achamos muito barulhento e movimentado,
pois fica na área dos restaurantes. Assim, buscamos outra opção e a encontramos
no pátio da Igreja Presbiteriana na cidade, anexo ao posto de combustível, que
estava em obras. Pedimos autorização (e a obtivemos) e ficamos por ali, meio
escondidinhos e tranquilos.
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Vista da janela do Theatro Guarany, com o lago e a região dos restaurantes, do outro lado |
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Nosso acampamento, no pátio da Igreja Presbiteriana, anexo ao Posto - neblina fechada pela manhã (friozinho) |
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Moinho de Vento - praça pública na cidade |
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Convento Stella Maris, hoje hotel (meio decadente) |
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Com a simpática Ervelyn Crislaine, em sua lojinha Café, Prosa & Arte |
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Casario bem preservado na cidade |
O dia seguinte amanheceu com
neblina densa, bem coisa de serra! Batemos perna pela cidade e fomos visitar os
outros 2 Museus, além do Convento Stella Maris. O Museu do Cangaço conta a
história de Virgulino Ferreira (o Lampião) e seus cangaceiros, que como uma
espécie de Robin Hood saqueavam as cargas do Governo distribuindo-as aos
pobres. Porém, isto durou pouco!!
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Museu do Cangaço |
Passaram a ser bandidos, pilhando
as vilas e aterrorizando o povo por onde passavam. E aqui não foi diferente!
Nos painéis do museu existem registros fotográficos de Lampião e seu bando, com
as atrocidades cometidas, inclusive marcando a ferro o rosto de mulheres que
eram “escolhidas” para serem de cangaceiros. Conta a história que o médico da
cidade de Triunfo recebeu a visita de Virgulino e teve de curá-lo de um tiro
recebido perto das nádegas!
O último Museu visitado foi o Museu
Elezier Xavier, artista plástico (técnica de aquarela) que nasceu e viveu aqui,
mudando-se aos 17 anos de idade para Recife, onde desenvolveu sua carreira. Foi
“afilhado” de Portinari e fez exposições na Europa e Estados Unidos.
Antes de deixarmos a cidade,
aproveitamos a Quermesse que acontecia na praça em frente ao lago, com direito a
forró ao vivo, distribuição gratuita de bolo e suco. Pela estrada do Borogodó,
descemos a serra até Flores e debaixo de chuva forte e alagamentos, deixamos o
estado de Pernambuco para trás e voltamos à Paraíba.
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Aproveitando a quermesse na praça |
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Distribuição de suco e bolo ao som de forró! |
Após pernoite tranquilo num posto
de combustíveis em Congo, seguimos para Cabaceiras, a famosa Roliúde
Nordestina. Chegamos num sábado e havia muitos turistas na cidade. Conhecemos a
Igreja Nossa Senhora da Conceição (1735) e o Museu Cinematográfico, onde há
painéis que contam como foram realizadas as filmagens de O Auto da Compadecida
e outras produções cinematográficas.
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Igreja de N. Sra da Conceição |
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Museu Cinematográfico |
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Padaria cenário de O Auto da Compadecida |
Cabaceiras, localizada no Sertão
do Cariri, foi fundada em 1735 pelo Capitão-mor Domingos de Faria Castro. A
outrora cidade mais seca do Nordeste hoje apresenta mudanças positivas em sua
vegetação e clima, com alteração da quantidade de precipitação no local. Além da
caatinga arbustiva, caracterizada pela presença de xiquexique, coroa-de-frade,
juazeiro, umbuzeiro, mandacaru, hoje já existe mais variedade de arbustos,
tornando a cidade mais verde e viva!
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Casario colorido e preservado da cidade |
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Vista panorâmica da cidade |
Claro que fomos até o local onde
está o famoso letreiro e o Mirante da Cruz, de onde se tem uma vista da cidade –
havia obras de infraestrutura sendo realizadas no local. Exploramos o centro da
cidade, muito bonita e colorida, com casario bem preservado e que estava todo
enfeitado ainda por ser época de festejos julinos e há alguns dias teve a Festa
do Bode Rei. O bode é estrela por aqui, girando a economia local. Aproveitamos para nos deliciar num restaurante
localizado na praça central e nos deliciamos com o bode guisado, cuscuz, frango
caipira ensopado, feijão e complementos, pagando R$ 18,00 por pessoa.
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Uma delícia!!! |
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Praça central |
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Cruzeiro no alto da cidade - de onde tem vista panorâmica |
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Bode Rei |
O Lajedo de Pai Mateus,
localizado a 30 km da cidade, é dos pontos turísticos tradicionais e onde se
paga taxa para visitação (pois é numa área particular). Por ter sido usado como
cenário em muitos filmes, tornou-se famoso e muita gente da capital vem para cá
nos finais de semana para curtir. O preço de R$ 60,00 por pessoa (em grupos com
menos de 4 pessoas) e R$ 40,00 por pessoa (em grupos com mais de 4 pessoas) e o
clima chuvoso não nos atraíram a ficar por lá, mesmo tendo sido permitido nosso
pernoite na área do estacionamento do Hotel Fazenda (chiquetérrimo e caríssimo)
gratuitamente. A área do estacionamento é de chão batido e com as chuvas dos
últimos dias, estava numa lama só!
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Capela N. Sra do Rosário (1860) |
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As "estrelas" da cidade |
Como ainda era cedo, aproveitamos
para seguir até Ingá, passando por fora de Campina Grande (que cidade
grande!).
Com a chuva intensa, acabamos nos
hospedando numa pousadinha bem simples, com área de estacionamento amplo e
plano, já no caminho para a Pedra do Ingá. Pagamos R$ 30,00 pelo pernoite, num
quarto simples e bem limpo, com o Garça num local fechado e seguro.
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Painel de 50m - Pedra do Ingá |
A Pedra do Ingá – Itacoatiara, em
tupi, “pedra pintada” - é um sítio arqueológico tombado pelo IPHAN, em 1944, no
qual existem inscrições rupestres feitas a cerca de 6000 anos! A área do
estacionamento é ampla e permitiria pernoite, caso tivéssemos vindo até aqui no
dia anterior.
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Marcas na rocha... mistério! |
Não se paga nada para visitar o
monumento, mas caso se queira o acompanhamento de um guia, paga-se uma taxa não fixa.
Acabamos nos juntando a um grupo e junto com o guia Marquinhos, em 2 min,
estávamos em frente a um paredão de gnaisse de 50m de comprimento e 3m de altura,
cheio de inscrições talhadas na pedra (petróglifos). Dentre os desenhos e
figuras diversas, identificam-se representações de animais, frutas, humanos e
constelações, como a de Órion, além do Sol.
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Ouvindo as explicações de Marquinhos dentro do Museu |
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Ossada da megafauna |
Não se sabe a origem nem a
motivação que levou um povo (ou povos) a fazer as inscrições neste conjunto
rochoso. Existem hipóteses que são apontadas pelos estudiosos de que uma
provável origem seja fenícia. Esta hipótese é defendida por um catedrático do
séc. XIX e é corroborada pela pesquisadora Fernanda Palmeira (início do séc. XX),
que percorreu toda a região e recolheu supostos vestígios desta civilização
antiga.
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Rio Bacamarte |
Por estar às margens do rio
Bacamarte que na época das cheias cobre todo o conjunto rupestre, revolvendo a
terra e friccionando as camadas superficiais das rochas, a datação de Carbono
14 não foi utilizada por ser inviável.
Muitos estudos têm ocorrido na
Pedra do Ingá, mas nada é conclusivo! Uma coisa é certa: o local carece de cuidados,
pois há pessoas “sem noção” que caminham por cima dos petróglifos, sem qualquer
atenção ou cuidado... o fim da picada!!!
Há, ainda, no local, um Museu –
custo de R$ 5,00 por pessoa - onde se pode ver réplicas de ossadas de Milodon,
de tatu gigante e de outros animais da Megafauna que já habitaram esta região.
Muito instigante e curioso.
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Casal de recife e o guia Marquinhos |
Depois de ficarmos 15 dias
perambulando pelo Sertão Nordestino, nos maravilhando e aprendendo muita coisa
nova, voltamos ao litoral paraibano para curtir praia, coqueiros, brisa marinha
e areia.
Mas isto já é outra história...
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