Viagem Família______________________________________

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sexta-feira, 7 de julho de 2023

Sertão Nordestino: dos 1000msnm à Roliúde Nordestina, têm de tudo!

Pedra do Ingá (PB)

Seguindo o roteiro do texto anterior, onde exploramos os Geoparques localizados no interior dos estados do RN, CE e PB, aqui seguimos o caminho, continuando a "volta pelo Sertão", percorrendo o extremo oeste do estado de Pernambuco, voltando ao Sertão Paraibano e ao seu litoral.

As surpresas que encontramos quando se percorre o interior dos estados nordestinos são grandes, a começar pelo clima: dependendo de onde se está, à noite é frio e o edredon é bem-vindo!

DEIXANDO O CEARÁ E A PARAÍBA PARA TRÁS POR UM MOMENTO

Estradinha "boa" em direção à Pernambuco

Quase chegando na "plantação de pau"!

Quando deixamos Santana do Cariri para trás, atravessamos a Chapada do Araripe - esta chapada está presente nos estados do Ceará, Pernambuco e Piauí - por estrada estreita, de chão e muita pedra (aqui conhecida por “piçarra”), com subida forte em reduzida!!

Ao chegarmos ao alto do platô, numa bifurcação, paramos pra perguntar a um senhor matuto a direção para Exu, ao que ele respondeu: “Lá na frentão, bem lá na frentão, tem uma plantação de pau... lá você pega à direita, pois à esquerda volta pra Crato.” Dito e feito. Lá na frentão havia uma plantação de pau (eucalipto) e uma placa meio apagada indicava à esquerda Crato (CE) e à direita, Exu (PE).

Agora em asfalto, meio ruim, descemos a serra em direção à Exu. A paisagem é linda, uma zona de transição entre o cerrado e mata atlântica (interessante que aqui, na Chapada, não está presente a caatinga!).

Já em Pernambuco, descendo a serra em direção à Exu

UM POUCO DE HISTÓRIA


Exu, situada na Serra do Araripe, na divisa dos estados de Pernambuco e Ceará, foi fundada em 1734 e emancipada em 1907. A denominação “Exu” possui duas versões. Uma é a corruptela do nome do povo “Açu” da nação Cariri e outra é o nome indígena de uma abelha de ferrão, “Inxu”, que ao ferroar causa muita dor. Por ser uma região rica em água e terra com boa qualidade para plantio e criação animal, foi invadida pelos primeiros colonizadores que expulsaram os indígenas cariri na região – estamos falando da época em que aqui pertencia a Capitania da Baía de Todos os Santos. Posteriormente vieram os jesuítas e estabeleceram a primeira capela.


Nossa surpresa foi descobrir que Exu é a terra natal do Gonzagão! É, ele mesmo, o Rei do Baião! Aproveitamos para tirar foto com a estátua do cidadão ilustre numa praça da cidade e seguimos até o Museu Aza Branca (com “Z” mesmo), casa onde Luiz Gonzaga viveu e onde está seu mausoléu.

Além de Luiz Gonzaga, a cidade também é o berço de Chiquinha Gonzaga, nascida Francisca Januária dos Santos, cantora, safoneira (sanfona de 8 baixos) e compositora brasileira (1927 – 2011).

Com Poeta Falcão (e seus cordeis) e Jober, viajante de bike

Já na entrada do Museu conhecemos o Jober, viajante de bike, que saiu de João Pessoa há um mês e está viajando com/em seu companheiro, Tubarão Negro. Logo encontramos o Poeta Falcão, que abrilhantou nossa visita com cordéis e poesias, além de nos acompanhar e explicar tudo na Casa de Januário (pai de Luiz Gonzaga, que era luthier e com quem Gonzagão aprendeu a tocar o baixo).


Fomos ao mausoléu, onde está também a esposa de Luiz, e ao Museu que relata toda a trajetória de vida do artista, seus prêmios, maçonaria, etc e tal. Interessante é que aqui é proibido tirar fotos (sabe-se lá porquê!).

Esta foto não existe, tá?

Por fim, visitamos a casa onde ele e sua esposa viveram os últimos anos de vida, muito simples e aconchegante! 





Despedimo-nos de Falcão e de Jober e seguimos em busca de um local para pernoite, já em Serrita.

Despedindo-nos do Jober e seu Tubarão Negro


No dia seguinte, parada para foto em Serra Talhada e início da subida para Triunfo, localizada a 1050 msnm!!!

Descendo em direção à Serra Talhada (ao fundo) pra depois subir pra Triunfo

Triunfo está localizada na Serra da Baixa Verde (planalto da Borborema) e o ponto mais alto de Pernambuco é no Pico do Papagaio (1200 msnm), um dos pontos turísticos da cidade. Fundada em 1884, Triunfo é conhecida por ser como “Oásis do Sertão” pelo seu clima ameno e chuvoso, diferente das outras cidadezinhas da circunvizinhança, cujo clima é semiárido.

"Subidinha" pra Triunfo

UM POUCO DE HISTÓRIA

O nome da cidade, Triunfo, é uma homenagem ao local onde Baixa Verde (nome anterior) e seus habitantes estavam se desenvolvendo, o que desagradava o município vizinho de Flores, cujos habitantes muitas vezes atacaram a feira local na tentativa de acabá-la, interferindo no comércio e seu sustento. Nestes ataques muita gente acabou morrendo, mas o povo de Baixa Verde resistiu e progrediu, mudando o nome da cidade para Triunfo em função disto.

Casario preservado e bonito da cidade

Inicialmente a região era ocupada pelos indígenas Cariri da nação Tapuia, mas no início do séc. XIX chegou ao local o frei capuchinho Vital de Frascarolo, trazendo algumas imagens, dentre elas a de Nossa Senhora das Dores, que acabou com Padroeira do local.


Theatro Cinema Guarany (1922)

Nossa primeira parada na cidade foi no Theatro Cinema Guarany, de estilo eclético e que foi inaugurado em 1922, cuja visitação é gratuita. Dali, sempre a pé, fomos ao centro de informação ao turista, anexo ao Museu da cidade, onde adquirimos o ingresso para todos os museus da cidade (são 4 no total).


Interior do Theatro

Museu da cidade e centro de informação ao turista

Ingressos para os Museus da cidade

Visitando o Museu Histórico da cidade de Triunfo

No Museu Casa do Careta a Jane nos explicou a origem e simbologia deste personagem, surgido em 1917, e seu treco. Inicialmente composto por quilombolas e indígenas, era um “bloco” que saía durante os festejos do reisado, festa popular que simboliza o nascimento de Jesus. Os brincantes saem “em trecas”, trajando roupas espalhafatosas, chocalhos e um relho – espécie de chicote que emite um som parecido com um tiro quando desferido nas pedras do calçamento ou no ar. As máscaras de origem indígena Tapuia, ainda são usadas para “esconder” os brincantes.

Museu Casa do Careta

Ouvindo as explicações da Jane

Lindos painéis nas ladeiras sem fim da cidade




Curiosidade: o frei Vidal de Frescolero, conhecido por frei Vidal da Penha, fixou residência num sítio na localidade de Baixa Verde (hoje Triunfo), depois mudando-se para Cabrobó. Em seu luga veio, o missionário frei Ângelo Maurício Niza que mandou construir uma capelinha, sob invocação de Nossa Senhora das Dores, que acabou virando a Padroeira da cidade.

Matriz N. Sra. das Dores (1803)


Por ficar no alto de um morro, achar local plano para acampar aqui na cidade deu um pouco de trabalho. Alguns viajantes ficam na área do lago, mas achamos muito barulhento e movimentado, pois fica na área dos restaurantes. Assim, buscamos outra opção e a encontramos no pátio da Igreja Presbiteriana na cidade, anexo ao posto de combustível, que estava em obras. Pedimos autorização (e a obtivemos) e ficamos por ali, meio escondidinhos e tranquilos.

Vista da janela do Theatro Guarany, com o lago e a região dos restaurantes, do outro lado

Nosso acampamento, no pátio da Igreja Presbiteriana, anexo ao Posto - neblina fechada pela manhã (friozinho)
Moinho de Vento - praça pública na cidade

Convento Stella Maris, hoje hotel (meio decadente)


Com a simpática Ervelyn Crislaine, em sua lojinha Café, Prosa & Arte

Casario bem preservado na cidade

O dia seguinte amanheceu com neblina densa, bem coisa de serra! Batemos perna pela cidade e fomos visitar os outros 2 Museus, além do Convento Stella Maris. O Museu do Cangaço conta a história de Virgulino Ferreira (o Lampião) e seus cangaceiros, que como uma espécie de Robin Hood saqueavam as cargas do Governo distribuindo-as aos pobres. Porém, isto durou pouco!!

Museu do Cangaço


Passaram a ser bandidos, pilhando as vilas e aterrorizando o povo por onde passavam. E aqui não foi diferente! Nos painéis do museu existem registros fotográficos de Lampião e seu bando, com as atrocidades cometidas, inclusive marcando a ferro o rosto de mulheres que eram “escolhidas” para serem de cangaceiros. Conta a história que o médico da cidade de Triunfo recebeu a visita de Virgulino e teve de curá-lo de um tiro recebido perto das nádegas!


O último Museu visitado foi o Museu Elezier Xavier, artista plástico (técnica de aquarela) que nasceu e viveu aqui, mudando-se aos 17 anos de idade para Recife, onde desenvolveu sua carreira. Foi “afilhado” de Portinari e fez exposições na Europa e Estados Unidos.






Antes de deixarmos a cidade, aproveitamos a Quermesse que acontecia na praça em frente ao lago, com direito a forró ao vivo, distribuição gratuita de bolo e suco. Pela estrada do Borogodó, descemos a serra até Flores e debaixo de chuva forte e alagamentos, deixamos o estado de Pernambuco para trás e voltamos à Paraíba.

Aproveitando a quermesse na praça

Distribuição de suco e bolo ao som de forró!

Após pernoite tranquilo num posto de combustíveis em Congo, seguimos para Cabaceiras, a famosa Roliúde Nordestina. Chegamos num sábado e havia muitos turistas na cidade. Conhecemos a Igreja Nossa Senhora da Conceição (1735) e o Museu Cinematográfico, onde há painéis que contam como foram realizadas as filmagens de O Auto da Compadecida e outras produções cinematográficas.

Igreja de N. Sra da Conceição 


Museu Cinematográfico

Padaria cenário de O Auto da Compadecida 



Cabaceiras, localizada no Sertão do Cariri, foi fundada em 1735 pelo Capitão-mor Domingos de Faria Castro. A outrora cidade mais seca do Nordeste hoje apresenta mudanças positivas em sua vegetação e clima, com alteração da quantidade de precipitação no local. Além da caatinga arbustiva, caracterizada pela presença de xiquexique, coroa-de-frade, juazeiro, umbuzeiro, mandacaru, hoje já existe mais variedade de arbustos, tornando a cidade mais verde e viva!

Casario colorido e preservado da cidade


Vista panorâmica da cidade

Claro que fomos até o local onde está o famoso letreiro e o Mirante da Cruz, de onde se tem uma vista da cidade – havia obras de infraestrutura sendo realizadas no local. Exploramos o centro da cidade, muito bonita e colorida, com casario bem preservado e que estava todo enfeitado ainda por ser época de festejos julinos e há alguns dias teve a Festa do Bode Rei. O bode é estrela por aqui, girando a economia local.  Aproveitamos para nos deliciar num restaurante localizado na praça central e nos deliciamos com o bode guisado, cuscuz, frango caipira ensopado, feijão e complementos, pagando R$ 18,00 por pessoa.

Uma delícia!!! 

Praça central

Cruzeiro no alto da cidade - de onde tem vista panorâmica

Bode Rei

O Lajedo de Pai Mateus, localizado a 30 km da cidade, é dos pontos turísticos tradicionais e onde se paga taxa para visitação (pois é numa área particular). Por ter sido usado como cenário em muitos filmes, tornou-se famoso e muita gente da capital vem para cá nos finais de semana para curtir. O preço de R$ 60,00 por pessoa (em grupos com menos de 4 pessoas) e R$ 40,00 por pessoa (em grupos com mais de 4 pessoas) e o clima chuvoso não nos atraíram a ficar por lá, mesmo tendo sido permitido nosso pernoite na área do estacionamento do Hotel Fazenda (chiquetérrimo e caríssimo) gratuitamente. A área do estacionamento é de chão batido e com as chuvas dos últimos dias, estava numa lama só!  

Capela N. Sra do Rosário (1860)

As "estrelas" da cidade

Como ainda era cedo, aproveitamos para seguir até Ingá, passando por fora de Campina Grande (que cidade grande!).

Com a chuva intensa, acabamos nos hospedando numa pousadinha bem simples, com área de estacionamento amplo e plano, já no caminho para a Pedra do Ingá. Pagamos R$ 30,00 pelo pernoite, num quarto simples e bem limpo, com o Garça num local fechado e seguro.


Painel de 50m - Pedra do Ingá

A Pedra do Ingá – Itacoatiara, em tupi, “pedra pintada” - é um sítio arqueológico tombado pelo IPHAN, em 1944, no qual existem inscrições rupestres feitas a cerca de 6000 anos! A área do estacionamento é ampla e permitiria pernoite, caso tivéssemos vindo até aqui no dia anterior.


Marcas na rocha... mistério!

Não se paga nada para visitar o monumento, mas caso se queira o acompanhamento de um guia, paga-se uma taxa não fixa. Acabamos nos juntando a um grupo e junto com o guia Marquinhos, em 2 min, estávamos em frente a um paredão de gnaisse de 50m de comprimento e 3m de altura, cheio de inscrições talhadas na pedra (petróglifos). Dentre os desenhos e figuras diversas, identificam-se representações de animais, frutas, humanos e constelações, como a de Órion, além do Sol.

Ouvindo as explicações de Marquinhos dentro do Museu

Ossada da megafauna

Não se sabe a origem nem a motivação que levou um povo (ou povos) a fazer as inscrições neste conjunto rochoso. Existem hipóteses que são apontadas pelos estudiosos de que uma provável origem seja fenícia. Esta hipótese é defendida por um catedrático do séc. XIX e é corroborada pela pesquisadora Fernanda Palmeira (início do séc. XX), que percorreu toda a região e recolheu supostos vestígios desta civilização antiga.


Rio Bacamarte

Por estar às margens do rio Bacamarte que na época das cheias cobre todo o conjunto rupestre, revolvendo a terra e friccionando as camadas superficiais das rochas, a datação de Carbono 14 não foi utilizada por ser inviável.

Muitos estudos têm ocorrido na Pedra do Ingá, mas nada é conclusivo! Uma coisa é certa: o local carece de cuidados, pois há pessoas “sem noção” que caminham por cima dos petróglifos, sem qualquer atenção ou cuidado... o fim da picada!!!

Há, ainda, no local, um Museu – custo de R$ 5,00 por pessoa - onde se pode ver réplicas de ossadas de Milodon, de tatu gigante e de outros animais da Megafauna que já habitaram esta região. Muito instigante e curioso.


Casal de recife e o guia Marquinhos

Depois de ficarmos 15 dias perambulando pelo Sertão Nordestino, nos maravilhando e aprendendo muita coisa nova, voltamos ao litoral paraibano para curtir praia, coqueiros, brisa marinha e areia.

Mas isto já é outra história...



 











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