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domingo, 15 de janeiro de 2023

Voltamos pra França??? Não, estamos na Guiana Francesa

Atravessamos o Rio Maroni (que faz a divisa entre o Suriname e a Guiana Francesa) depois de termos passado praticamente o dia todo dentro da aduana, em Albina (Suriname). O ferry/balsa que faz o trajeto só o faz quando há veículos para atravessar de um lado para o outro – eles vão esperando acumular um tanto para efetuar o transbordo. Lá pelas 16h vimos a balsa se aproximar e nos despedimos do Suriname.

Plage de Montjoly, próximo de Caiena

Custo da balsa: 40 € (36 €: carro + motorista e 4,30€: passageiro)!!!

Já em solo francês, fomos até a aduana e demos entrada com nossos papéis europeus (eu tenho passaporte austríaco e Marcos apresentou sua identidade alemã). Você deve estar se perguntando: por quê?

Parque Sables Blans

DOCUMENTAÇÕES LEGAIS

Em função da grande imigração ocorrida há uns 10/15 anos, de brasileiros (ou surinamense, guianeses, haitianos,...) atravessando para a França, o estado da Guiana Francesa adotou medidas legais para evitar ou minimizar os efeitos desta entrada ilegal e hoje, para brasileiros (e algumas outras nacionalidades) é necessário apresentar o visto de entrada para a Guiana Francesa. O único local onde se pode tirar este visto é na Embaixada da Guiana Francesa, em Brasília, e o custo da documentação é alto (99 €).

Legalmente falando: a Guiana Francesa, mesmo sendo um Estrado da França, é uma região ultramarina francesa que não pertence ao Espaço Schenghen e por este motivo existe a exigência de visto.  

Além deste inconveniente, existe ainda, para quem entra na Guiana Francesa via Brasil (Oiapoque – AP), o seguro obrigatório para o carro, também chamado de Carta Verde, cujo valor é de 260 Euro (válido para os 3 meses de permanência permitida).

Como nós estávamos entrando “do outro lado” (vindos do Suriname) e havíamos pago o seguro para as Guianas (Guiana, Suriname e Guiana Francesa) em Lethem, no valor de R$75,00, aproximadamente, apresentamos nossa apólice de seguro que só foi aceita após explicarmos e mostrarmos a inclusão do estado francês nela.

Tudo resolvido, fomos até um ATM sacar uns Euro e aproveitamos o Intermarché (rede de supermercados onde efetuávamos nossas compras na França/Espanha/Portugal) para comprar umas coisinhas que não existem na América do Sul. Ops... estamos na América do Sul!!! Rsrsrs

Centenas (pra não dizer milhares) de carros abandonados nas margens das rodovias... as histórias são muitas: desde desmanche de carros roubados no vizinho Brasil, até a falta de políticas públicas de descarte de carros, tornando o preço para descarte em ferro-velho absurdo...

CURIOSIDADES

A composição étnica do país é bem eclética. Após a retirada francesa da Guerra do Vietnã, em 1950, a França ajudou a reassentar refugiados hmong do Laos, que fugiram do regime comunista de Pathet Lao, imposto ao Laos em 1975. No final da década de 1980, mais de 10 mil refugiados surinameses, principalmente quilombolas, chegaram à Guiana Francesa fugindo da Guerra Civil do Suriname. Mais recentemente um grande número de brasileiros e haitianos entraram no país trabalhando na mineração e extração de madeira.

Existem postos de fiscalização próximos das duas fronteiras (com o Suriname, em Iracoubo e com o Brasil, próximo de St. George de Oiapoque) de modo a tentar coibir a entrada de pessoas ilegalmente e também da retirada de ouro e madeira.

Incrível ver a diferença que existe entre o Suriname/Guiana e a Guiana Francesa. A começar pela pavimentação da estrada, a infraestrutura das cidadezinhas é completamente outra, o recolhimento do lixo segue padrões franceses (com separação parcial) e os produtos oferecidos (e preços) são iguais aos da Europa.  

Igreja de São José, em Iracoubo (1893)

Lindo interior com pinturas em afresco


Mesmo o salário mínimo mensal sendo na casa de 1400€, o custo de vida por aqui é alto (mesmo para padrões europeus). Um litro de leite não sai por menos de 1,30€, frutas e verduras também custam em torno de 4€ o quilo. Uma refeição básica, para duas pessoas, não custa menos de 25€. O litro de diesel estava 1,85€ (R$10,36).

A Guiana Francesa é um departamento ultramarino e segunda maior região da França, com aproximadamente 300 mil habitantes, dos quais metade vive na capital, Caiena, e sua região metropolitana. É o único território continental das Américas que ainda está sob o domínio de um país europeu.

Quem governa esta região é a Assembleia da Guiana Francesa, responsável pelo governo regional e departamental.

Existem registros (informais ou da oposição) que deixam claro que a extração de ouro e mata nobre no país é chancelada pela França e que são de 500kg a 1ton de ouro retirados mensalmente, direto para a França... mas isto são "as más línguas!"

O primeiro assentamento francês foi em 1503, mas apenas a partir de 1643 é que a colonização ocorreu efetivamente, com a instalação de fazendas de açúcar. Os plantadores “importavam” africanos como trabalhadores escravizados em grandes fazendas açucareiras e outras plantações.



A abolição da escravatura se deu na época da Revolução Francesa (1789) e 10 anos mais tarde a Guiana foi designada como departamento francês, depois passando a ser usada como colônia penal, estabelecendo uma rede de campos e penitenciárias ao longo do litoral, onde os prisioneiros eram colocados para trabalhos forçados, em situação desumana e tortura.  Dos 56 mil prisioneiros alocados nas Îles du Salut (3 ilhas com 3 prisões que funcionaram entre 1852 e 1953), menos de 10% sobreviveram à sentença!!

Quem não conhece e assistiu o filme Papillon? Tanto na sua versão antiga, com Steve McQueen no papel protagonista, quanto na versão atual, ali está retratado algumas atrocidades cometidas dentro das colônias penais estabelecidas na Guiana. Tentamos visitar a Île du Diable, onde se deu a história de Papillon, porém o alto custo do passeio não coube em nosso orçamento. Custo do passeio: 47€ por pessoa.

Dreyfus Tower - torre de comunicação com as Îles du Salut - aqui existia uma prisão

Dreyfus Tower e, ao fundo, onde hoje está o Hotel ficava a prisão no continente

Após um acampamento selvagem na área de estacionamento do Parque Sables Blancs, seguimos para Kourou, importante cidade do país onde está localizado o Centro Espacial da Guiana, fundado em 1965 por Charles De Gaulle. Nas margens da rodovia, entre Saint-Laurent-du-Maroni e Kourou, há locais para piquenique e pernoite, com estrutura básica (banheiro, igarapé, mesas cobertas) a cada 20km, aproximadamente.

Já na cidade buscamos um local bacana para ficarmos e havia uma marcação no IOverlander (APP) de um parque linear costeiro  - Parc de la Cocoteraie - onde há um grande estacionamento e possibilidade de dormir. Fomos para lá e logo fizemos amizade com os proprietários do Restaurante Copacabana, onde há uma bandeira do Brasil exposta. Os proprietários, Frank, francês de Paris e Rosilene, brasileira de Macapá, tocam o bar há anos e depois de muito bate-papo, filosofia e troca de ideias, drink e café, fomos buscar um local sombreado e adequado para passar a noite.

Com Frank, francês de Paris, proprietário do Restaurante Copacabana

A neblina/maresia não permitiu a vista das Îles du Salut

Ali, no estacionamento, conhecemos muitas pessoas que se aproximavam por curiosidade e perguntavam sempre: vocês são mesmo do Brasil? Uma família muito linda veio bater papo e nos convidou para ficarmos em sua casa, oferecendo água e energia elétrica em seu quintal. Ismael (espanhol), Maria (argentina) e as meninas Ocean e Ariane nos receberam por duas noites, onde pudemos aprender muito sobre a Agência Espacial Europeia (ESA) para a qual trabalham e o Programa Ariane – Arianespace – no qual Maria é física.


Família linda: Maria, Ismael, Ariane (1a) e Ocean (4a)

Tentamos visitar o Musée de L’Espace - Centre Spatial Guyanais, porém descobrimos que ele está em reforma até o final de 2023. Kristhel e Daphné, funcionárias do Centro Espacial, nos deram explicações e dicas de como percorrer a Rota Cênica do Espaço, onde estão as instalações diversas do projeto Ariane e de onde são lançados os foguetes para o espaço. Percorremos todo o trajeto (uns 10km) com o Garça, parando aqui e ali para tirar fotos.



Existe um passeio guiado, gratuito, com 2,5h de duração feito com bus e guia, que precisa ser pré-agendado com 48h de antecedência (por questões de segurança). Fizemos o agendamento, porém acabamos indo embora da cidade antes.  (visites.csg@cnes.fr)

Kourou foi habitada por indígenas da etnia Kalina ou Galibi, antes da chegada dos europeus. Os jesuítas foram os primeiros a batizar alguns indígenas, porém a missão foi abandonada em função da grande incidência de doenças tropicais. A primeira leva de colonização, por volta de 1780, trouxe entre 10 e 12 mil cidadãos, na maioria franceses que não conseguiram sobreviver às condições encontradas. Cerca de 6 mil pioneiros morreram e muitos buscaram abrigo nas ilhas próximas (Îles du Salut) por lá não haver tantos insetos em função do vento constante.

Com Kristhel e Daphné, do Centro Espacial

Modelo do módulo enviado ao espaço

Ao fundo, instalações onde se montam os foguetes


Apenas por volta de 1855, durante a primeira corrida do ouro e também a segunda abolição da escravatura (1848!) e com a criação das prisões ao longo da costa é que a região veio a se desenvolver e ter mais habitantes. Os primeiros prisioneiros chegaram em 1862.

Deixamos Kourou para trás e seguimos para a capital, distante 80 km. Encontramos uma cidade grande e, como toda cidade grande, com grandes problemas. A parte histórica de Cayenne está abandonada e suja.


Palácio do Governo - Assembleia da Guiana Francesa

Fomos até o Fort Cépérou, onde havia um forte construído em madeira em cima do morro, com vista para toda a baía. Não há nenhum resquício do antigo forte (também pudera, ele foi construído no melhor “estilo apache”, com paliçada de madeira ao redor e o que se vê são apenas os locais onde estavam as construções principais). O local, que poderia ser bem bonito, está tomado por desocupados e depois de meia dúzia de fotos fomos embora. Passeamos de carro pelas ruas da cidade, percorrendo a Place des Palmistes (Praça de Palmeiras), a Catedral de São Salvador (fechada e nada especial – não mereceu uma foto) e paramos no Place des Amandiers. A praça dos Amantes está localizada na beira mar, próxima do mangue. O local é bem bonito e atrai muitos casais, merecendo algumas fotos.

Fort Cépérou

Construções abandonadas dentro da área do forte


Vista panorâmica da cidade

Vista da cidade

Uma curiosidade sobre Caiena é que entre os anos de 1809 e 1817 a região toda foi dominada pelos portugueses e o governador brasileiro João Severiano Maciel da Costa substituiu o então governante francês, Victor Hughes. É resultante desta época a introdução, no estado do Amapá, da variedade caiena (ou caiana) de cana-de-açúcar e também da fruta-pão.

Vista do mangue na Place des Amandiers, ao fundo, construções da parte histórica da cidade de Caiena

Caribe?? rsrsr

Casario antigo, estilo criole


Memorial em homenagem à Abolição da Escravatura

Resolvemos buscar local para acampar fora da capital e o lugar escolhido foi Rémire Montjoly, localizado na região metropolitana de Caiena. A cidadezinha é usada como dormitório e local de descanso dos moradores da capital, possuindo parques, áreas verdes, praias e foi para a Plage de Montjoly (praia), na Crique Mouche (península), onde paramos para curtir a natureza e fazer uma trilha – Sentier des Salines (Trilha das Salinas). O local foi também o escolhido para pernoitarmos.

Plage de Montjoly


Península e encontro do rio com o mar - Crique Mouche

Nosso último acampamento na Guiana Francesa... choveu "pouco"

Nossa passagem pela Guiana Francesa foi rápida – 5 dias! Mas foram dias muito intensos e de descobertas. Já estávamos com o friozinho na barriga, pois a partir do dia seguinte, retornaríamos para o Brasil e desta vez, sem saídas para outros países até o sul... estes são os planos, né?

Bora conhecer os últimos estados da região Norte do Brasil que faltam para conhecermos: Amapá e Pará!!! Mas esta já é outra aventura e outras histórias...

Na ponte com o Oiapoque. Olhe o Brasil logo ali!!

Au revoir, France


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